segunda-feira, 25 de abril de 2022

Os cargos pertenciam a uma família e não ao funcionalismo público

Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs




As associações e as fundações segundo o Direito

Em Direito podem-se distinguir duas espécies de pessoas jurídicas: as associações e as fundações. Associação é, pelo menos na prática, um conjunto de pessoas que são ou podem vir a ser coletivamente proprietários de um determinado patrimônio, conforme a sociedade possua ou não bens.

O direito de propriedade de cada um dos membros da associação sobre esse patrimônio é tal, que podem, em determinadas condições, dissolver a sociedade por mútuo acordo, dividindo os bens entre si.

Se quiserem, podem também fazer doação do patrimônio para outra sociedade, e se lhes aprouvesse poderiam até queimá-lo. Isto porque os membros de uma sociedade, coletivamente falando, exercem sobre o patrimônio social a plenitude da propriedade.

A configuração jurídica da fundação, porém, é diferente. Ela é um conjunto de bens, doados ou legados por um instituidor, acrescido muitas vezes por doações sucessivas, e que constituem um só patrimônio.

Mas este patrimônio não pertence a ninguém. Não há quem dele possa dizer-se dono. Há os beneficiários do patrimônio, que são as pessoas em vantagem de quem este último existe.

Há ainda os que dirigem o patrimônio, não como quem é dono, mas como em-pregado, sem retirar para si nenhuma vantagem pessoal. Podem receber um ordena-do, mas não podem enriquecer-se com aqueles bens.

Estado-fundação e Estado-propriedade

Pelo Direito moderno, quem governa situa-se, em relação ao Estado, como o gestor de uma fundação em relação aos bens desta.

Um presidente de República, ou mesmo um rei, segundo a mentalidade mo-derna, não tem o direito de usar ou de reger os negócios sociais em proveito próprio, mas apenas em benefício do Estado.

Ele percebe um ordenado, como um empregado, presta determinados serviços e se retira. Não tem nenhum direito de propriedade sobre o cargo ou sobre o patrimônio do Estado. Nada há que o ligue a esse patrimônio por espécie alguma de propriedade.

Isto se dá de alto a baixo na escala social. Desde um rei ou um presidente de República, até um contínuo de repartição, todos estão em face do Estado, segundo o pensamento moderno, mais ou menos como os gerentes ou os empregados de uma fundação em face desta.

A característica do direito medieval era inteiramente outra. O governador de um Estado, o senhor feudal, o dirigente da cidade, colocavam-se em face do bem público, não como um simples terceiro, mas de maneira tal que houvesse um certo direito de propriedade sobre a função pública de que eram detentores.

A concepção medieval não era portanto a de um Estado gerido à maneira de uma fundação, e em relação à qual todos são terceiros, mas sim a de um Estado entendido como uma sociedade, na qual todos têm um tal ou qual direito de proprieda-de.

Mas havia os que tinham sobre o Estado uma maior participação na propriedade. Isto se dava, ora graças a um direito histórico, ora a grandes feitos, grandes habilidades, grande dedicação na defesa dos bens públicos, ou ainda a qualquer daquelas razões pelas quais um homem se afirma e sobrepuja os demais.

Esses eram os que constituíam as famílias, e os homens mais importantes e graduados. Eles dirigiam o Estado à maneira de co-proprietários.

O rei e o senhor feudal não eram simples titulares do cargo que ocupavam, mas sim os eminentes, dentre os inúmeros proprietários do reino ou do feudo. Os demais tinham um direito de propriedade menor.

A ideia de tudo se considerar como propriedade era tal que, na casa real, até os empregos eram considerados como sendo de propriedade. Assim é que se chegou a mencionar em alguns documentos uma pessoa “que tinha por feudo a cozinha real”.

Temos disto, no direito brasileiro, uma revivescência muito pálida, mas ainda viva: os cartórios de notas.

O tabelião não é propriamente um funcionário público, mas sim o proprietário do cartório; ele presta determinado serviço ao público, credenciado pelo Estado.

Mas sendo ele o proprietário de seu cartório, sua posição é por isso profundamente diferente da de um funcionário público, que não é o proprietário da repartição onde trabalha, como por exemplo um secretário da repartição de Águas e Esgotos.

Este é apenas um funcionário que dirige uma máquina anônima.

Como é o tabelião para seu cartório, assim era o funcionário na concepção medieval. O reino poderia ser considerado como um grande cartório, onde o rei seria o tabelião-mor; os nobres seriam oficiais graduados e co-participantes dos lucros; e por fim a plebe, que também participaria desses lucros.

Ao contrário, no Estado moderno, monárquico ou republicano, impera o ano-nimato, a pura repartição pública, semelhante à organização de uma fundação, constituindo-se portanto num Estado completamente despersonalizado.


continua no próximo post: A participação na propriedade e no governo medieval


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