segunda-feira, 29 de maio de 2023

Bruges. exemplo de cidade medieval burguesa e mercantil

Cidade das pontes e dos canais
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs







Bruges recebeu seu nome, segundo se afirma, da palavra Brug, que, em flamengo, quer dizer ponte.

Com efeito, tudo bem contado, a cidade possui, creio, cinqüenta e seis.

Ela tem, além disso, sete portas, oito praças públicas e duzentas ruas.

Por isso, mestre Adrien Bartaud, professor de eloqüência em Louvain, onde morreu em 1542, disse: “Pulchra sunt oppida Gandavum, Antuerpia, Lovanium, Mechlina, , sed nihil ad Bruges”.

O que significa: “Gand, Antuérpia, Louvain e Malines são belas cidades, mas nada em comparação com Bruges”.

Com efeito, na época em que o bom doutor escrevia este elogio pomposo, ou seja, sob o reino de Felipe, o Bom (pai de Carlos, o Temerário), Bruges era não somente uma das mais belas, mas ainda uma das mais ricas cidades do mundo.

Cidade invejada pela sua beleza
Só a corporação dos tecelões contava cinqüenta mil homens, ou seja oito mil a mais de que hoje é toda a população.

E no tempo de Guicciardini, mesmo que Bruges estivesse já em decadência, encontravam-se ali sessenta e oito ofícios ou corporações diferentes.

Junte-se a isso uma possante burguesia que fez mais de uma vez tremer não só seus Condes, mas ainda os Reis da França, numerosas famílias nobres, dezessete casas consulares das principais nações da Europa, uma população flutuante de negociantes estrangeiros que afluíam de todas as partes do globo, e se terá uma idéia do que era a capital das Flandres.

De resto, um exemplo curioso dessa prosperidade foi dado em Gand. Carlos V, tendo necessidade de dois milhões de florins, emprestou-os de um negociante chamado Deans, e no mesmo dia do empréstimo fez-lhe anunciar que em sinal do reconhecimento iria jantar com ele. O negociante ofereceu ao Imperador um magnífico banquete, e à sobremesa rasgou o compromisso, de Carlos V.

Riqueza da cidade. Capela da relíquia do Preciosíssimo Sangue
– Sire, disse-lhe, passando os pedaços rasgados sobre uma salva, não é muito caro pagar dois milhões de florins pela honra que Vossa Majestade me fez hoje.

A partir do século XIV começa o grande esplendor de Bruges. Em 1393, um tiro a arco teve lugar em Tournai e 387 arqueiros se reuniram provindos de 48 cidades, entre as quais Paris se fizera inscrever. Os brugenses não conseguiram o prêmio de arco, é verdade, mas obtiveram o da mais rica apresentação.

Em 1429, esse esplendor aumentou com as festas que deu, a propósito de seu casamento com Isabel de Portugal, o Conde Felipe, o Bom.

Foi, como se sabe, no meio dessas festas, e para vingar algumas 'plaisanteries' a propósito do louro um tanto discutível de cabelo de sua jovem esposa, que Felipe, o Bom, instituiu a Ordem de Tosão de Ouro .

Prefeitura de Bruges
Foi também em Bruges que tiveram lugar as cerimônias de casamento de Carlos, o Temerário. E foi lá também, onde entrara triunfante, que seus restos foram trasladados pelos cuidados de Carlos V, seu bisneto, em 1550, ou seja setenta e três anos depois de sua morte. Durante esse intervalo, ficaram na igreja de São Jorge, em Nancy.

Carlos, o Temerário, encontrou adormecida na capela à qual o conduziam, Maria de Borgonha, sua filha. Foi depositado lado a lado junto dela. Em 1558 Felipe II ordenou que fosse construído para o pai um túmulo semelhante ao que abrigava já o corpo da filha, que fora edificado por ordem de Maria d'Austria.

É lá que ainda hoje repousam, na terceira capela à direita de quem entra. Carlos está coberto com sua couraça de batalha, tendo a coroa de soberano à cabeça, a Ordem do Tosão de Ouro sobre o peito, um leão a seus pés, o elmo à sua direita e as luvas à esquerda, com sua divisa que é ao mesmo tempo a do herói de Montlhéry, o afoito Merat: “Eu a comecei, que as conseqüências me advenham”.

Este túmulo, um dos mais magníficos que se possa ver, é todo de cobre dourado, os ornamentos são em prata e esmalte, e em torno dele estão, em escudos, as armas das principais casas da Europa às quais estava unido.

(Fonte: Alexandre Dumas, “Excursions sur les bords du Rhin – Impressions de Voyage”, Calmann-Lévy Editeurs, Paris, Tomo I, pp. 112 a 115)

Bruges, na Bélgica: uma das cidades mais originais do mundo






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segunda-feira, 15 de maio de 2023

Cidade medieval: exemplo para restaurar a sociedade e a religião em crise – 2

Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
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Continuação do post anterior: Cidade medieval: exemplo bom para restaurar a sociedade e a religião em crise, ensinou famoso arquiteto inglês – 1


 
Pugin levou seu combate para o coração das cidades industriais de Birmingham e Sheffield.

Ele as achava “minas inesgotáveis de mau gosto”, infestadas de “edifícios gregos, chaminés fumegantes, agitadores radicais e dissidentes”.

A igreja de São Chad, que Pugin construiu em Birmingham no meio da sujeira do bairro dos fabricantes de armas, tornou-se a primeira catedral inglesa construída após a de Saint Paul.

Politicamente, Pugin poderia ser definido como um radical conservador.

Ele queria reformar a sociedade levando-a de volta a uma hierarquia benigna, a um medievalismo no qual cada classe poderia olhar para a que lhe era superior e dela receber apoio, enquanto os de cima aceitavam a responsabilidade de proteger os que estavam embaixo.

Igreja de Saint Chad em Birmingham,
Uma das grandes realizações de Augustus Welby Northmore Pugin (1812-1852).
Em 1841, ele publicou a segunda edição do Contrastes, acrescentando todo um panorama moral.

A cidade medieval, com seus capiteis graciosos e suas sólidas muralhas, era confrontada com o seu equivalente moderno de muros em cacos, capiteis em ruínas e o horizonte dominado por olarias e fábricas.

Seus imitadores – todos eles mais vulgares e despreocupados – lhe roubaram grande parte da clientela.

Seu trabalho no Parlamento de Westminster havia se tornado uma rotina monótona.

Por uma triste ironia, seu último projeto, feito em janeiro de 1852, estava destinado a ser o mais famoso: a torre do relógio do Palácio de Westminster, o célebre Big Ben.

Ele morreu em setembro de 1852, aos 40 anos de idade.




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segunda-feira, 1 de maio de 2023

Cidade medieval: exemplo para restaurar a sociedade e a religião em crise – 1

Big Ben, obra mais famosa de Pugin, simbolo da Inglaterra
Big Ben, obra mais famosa de Pugin, simbolo da Inglaterra.
Todas as fotos deste post são de obras de Pugin
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
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O estilo de uma época pode ser um fator de regeneração social, cultural, moral e religiosa?

Evidentemente, depende do estilo.

Mas, em concreto, a arquitetura da cidade medieval poderia ser – e segundo veremos abaixo, historicamente o foi – um fator poderoso para a recuperação social e moral de um país.

E, em concreto, para a Gra-Bretanha do século XIX, segundo o mais famoso arquiteto inglês dessa época A. W. N. Pugin.

Pugin é o criador do famoso Big Ben, hoje símbolo de Londres e da Inglaterra.

Augustus Welby Northmore Pugin, nascido em Londres em 1º de Março de 1812, tinha apenas 24 anos quando publicou o livro Contrastes.

O autor ofereceu nele todo um programa que redefiniu a arquitetura como uma força moral, imbuída de significado político e religioso. Foi um primeiro ensaio sobre os problemas da cidade moderna.

Foto aérea da cidade de Tallinn, Estônia, modelo vivo de uma cidade medieval saudável, bonita que convida à virtude numa existência aprazível
Foto aérea da cidade de Tallinn, Estônia,
modelo vivo de uma cidade medieval saudável, bonita
que convida à virtude numa existência aprazível
Uma década depois, aconteceram os primeiros surtos de cólera e alguns dos piores episódios de agitação civil na história britânica.

Em Bristol o Palácio do Bispo foi queimado pelos manifestantes, e em Nottingham o castelo foi destruído.

A mensagem de Pugin era simples: se algo está errado em nossas cidades, algo está errado conosco, sendo necessárias reformas na sociedade e na arquitetura.

Em Contrastes ele defendeu um renascer da arquitetura gótica medieval, e com ela um retorno à fé e às estruturas sociais da Idade Média.

Cada desenho reproduzia um prédio urbano moderno comparado com o seu equivalente no século XV.

Assim, a representação de uma pousada no estilo tardio da época do rei George, construída grotescamente num bloco de casas geminadas, aparecia ao lado do Hotel Angel de Grantham com suas sacadas encantadoras e suas adegas repletas de cerveja.

Câmara dos Lordes, trono onde a rainha inaugura as sessões do Parlamento britânico
Câmara dos Lordes, trono onde a rainha inaugura as sessões do Parlamento britânico
Um de seus mais lucrativos empregos consistiu em fornecer detalhes decorativos para o projeto vencedor do Parlamento de Londres.

Ele desenhou alguns de seus mais admirados ambientes, como o interior da Câmara dos Lordes.

Pugin quis reconstruir a Grã-Bretanha através de uma arquitetura de tipo medieval católica.

Foi uma cruzada inimaginável, mas o sucesso foi maior do que o esperado.

Quando completou 30 anos, Pugin havia construído 22 igrejas, três catedrais, três conventos, meia dúzia de casas, escolas diversas e um mosteiro cisterciense.


continua no próximo post: Cidade medieval: ambiente bom para restaurar a sociedade e a religião em crise, ensinou famoso arquiteto inglês – 2

(Fonte: Excertos de Rosemary Hill, autora de "Arquiteto de Deus: Pugin e a construção da Grã-Bretanha romântica" (Penguin Ed.). Clarin Arquitectura, Buenos Aires, 2012/05/03)




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