segunda-feira, 5 de agosto de 2019

Deslumbrante crescimento não planificado
do comércio medieval

A atividade comercial recuperou as vías fluviais pouco aproveitadas
A atividade comercial recuperou as vías fluviais pouco aproveitadas
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs







Cada cidade possuía, num grau difícil de imaginar nos nossos dias, a sua personalidade própria, não somente exterior, mas também interior, em todos os detalhes da sua administração, em todas as modalidades da sua existência.

São geralmente, pelo menos no Midi, dirigidas por meirinhos, cujo número varia: dois, seis, por vezes doze; ou ainda um único reitor reúne o conjunto dos cargos, assistido por um preboste que representa o senhor, quando a cidade não tem a plenitude das liberdades políticas.

Muitas vezes ainda, nas cidades mediterrânicas faz-se apelo a um poderoso (podestà), instituição muito curiosa.

O poderoso é sempre um estrangeiro (os de Marselha são sempre italianos), ao qual se confia o governo da cidade por um período de um ano ou dois.

Em toda parte onde foi empregado, este regime deu inteira satisfação.



Em todo caso, a administração da cidade compreende um conselho eleito pelos habitantes, geralmente por sufrágio restrito ou com vários graus, e assembléias plenárias que reúnem o conjunto da população, mas cujo papel é sobretudo consultivo.

Os representantes dos ofícios têm sempre um lugar importante, e sabemos qual foi a parte ocupada pelo preboste dos comerciantes em Paris nos movimentos populares do século XIV.

A grande dificuldade com que as comunas se debatem são os embaraços financeiros.

Marceneiro e sua família. Os locais de trabalho costumavam ser na própria residência familiar.
Marceneiro e sua família.
Os locais de trabalho costumavam ser na própria residência familiar.
Quase todas se mostram incapazes de assegurar uma boa gestão de recursos.

O poder é, aliás, rapidamente absorvido por uma oligarquia burguesa, que se mostra mais dura para com o povo miúdo do que tinham sido os senhores, daí a rápida decadência das comunas.

São muitas vezes agitadas por perturbações populares, e periclitam a partir do século XIV; um tanto ajudadas, é preciso dizê-lo, pelas guerras da época e pelo mal-estar geral do reino.

Nos séculos XII e XIII o comércio toma uma extensão prodigiosa, já que uma causa exterior, as cruzadas, vem dar-lhe um novo impulso.

As relações com o Oriente, que nunca tinham sido completamente interrompidas nas épocas precedentes, conhecem então um vigor novo.

As expedições ultramarinas favorecem o estabelecimento dos nossos mercados na Síria, Palestina, África do Norte, e mesmo nas margens do mar Negro.

Italianos, provençais e languedócios fazem entre si uma severa concorrência, e se estabelece uma corrente de trocas cujo centro é o Mediterrâneo.

Ela vai seguindo a estrada secular do vale do Reno, do Saône e do Sena até ao norte da França, países flamengos e Inglaterra.

Essa estrada já era seguida pelas caravanas que, antes da fundação de Marselha no século VI a.C., transportavam o estanho das ilhas Cassitérides — isto é, da Grã-Bretanha — até aos portos freqüentados pelos comerciantes fenícios.

É a época das grandes feiras de Champagne, Brie e Ilha de França — Provins, Lagny, Londit, San Denis, Bar, Troyes — aonde chegam as sedas, os veludos e os brocados, o alúmen, a canela e o cravo-da-Índia, os perfumes e as especiarias vindos do centro da Ásia, e que em Damasco ou em Jaffa eram trocados pelos tecidos de Douai ou de Cambrai, as lãs da Inglaterra e as peles da Escandinávia.

As casas de comércio de Gênova ou de Florença tinham nos nossos mercados as suas sucursais permanentes.

Os banqueiros lombardos ou de Cahors negociavam aí com os representantes das hansas do Norte e entregavam letras de câmbio válidas até nos distantes portos do mar Negro.

A atividade comercial tinha seu epicentro nas feiras livres em praças públicas
A atividade comercial tinha seu epicentro nas feiras livres em praças públicas
As nossas estradas conheciam assim uma extraordinária animação. A importância do mercado oriental é capital na civilização medieval.

Já a Alta Idade Média tinha conhecido o Oriente através de Bizâncio: a igreja de Paris recitava em grego uma parte dos seus ofícios; foram os marfins bizantinos que verdadeiramente reensinaram ao Ocidente a arte esquecida de esculpir a madeira e a pedra; e a decoração dos manuscritos irlandeses inspira-se nas miniaturas persas.

Mais tarde os árabes conduzem as suas conquistas com a brutalidade que sabemos, e cortam por algum tempo as pontes entre as duas civilizações.

Mas vêm as cruzadas, e o mercado oriental — ao qual corresponde, aliás, um mercado “franco” na Ásia Menor, que trabalhos recentes manifestaram — banha toda a Europa e a faz conhecer a vertigem do tráfego, o deslumbramento dos frutos estranhos, dos tecidos preciosos, dos perfumes violentos, dos costumes suntuosos, e inunda com a sua luz essa época apaixonada pela cor e pela claridade.

Sobretudo multiplica esse gosto pelo risco, essa sede de movimento, que na Idade Média coexiste de forma tão tocante com a ligação à terra.



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