A família gerou o Estado medieval |
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de política internacional, sócio do IPCO, webmaster de diversos blogs |
Os séculos mais aflitivos da História foram, certamente, quando ruiu o Império Romano do Ocidente e a Europa viu-se invadida pelas primeiras hordas bárbaras.
Os francos eram de um barbarismo o mais rude que se possa conceber. Mas com o passar do tempo foram sendo civilizados, embora precariamente.
Nos séculos VII e VIII as hordas representavam apenas pouco menos que a barbárie.
Fora este, tão somente, e após tremenda luta, o modestíssimo fruto conseguido pela Igreja Católica.
Alguns ela arrancara ao arianismo, convertera outros, e ia conseguindo um lento processo de mitigação e dulcificação dos costumes.
Sobre esta imensa obra, ainda em começo, sopraram então, de modo verdadeiramente trágico, os tufões da adversidade.
As torneiras do mundo não cristão se abrem, e catadupas de pagãos invadem a Europa.
Da Rússia e da Prússia, regiões ainda desconhecidas, desceram bárbaros, ainda mais primitivos que os da primeira invasão, assolando, saqueando, reproduzindo os horrores antes perpetrados no Império Romano do Ocidente.
Bárbaros extinguiram a civilização romana |
Em determinado momento, tomados de um furor navegatório, famílias, tribos, nações, o reino inteiro meteu-se em barcos e pôs-se a viajar.
Iam em cascas de nozes, beliscando o litoral, saqueando, comendo, arrasando.
Alguns de seus chefes intitulavam-se “reis do mar” ou vikings.
Nesta sanha chegaram até Constantinopla e invadiram Bizâncio, sempre assolando tudo, fazendo por vezes incursões profundas e deixando alguns pelas terras onde passavam, que continuavam a obra de destruição.
De outro lado, vindos da Espanha e invadindo até o coração da França, surgiram os sarracenos.
A hierarquia do lar gerou a hierarquia feudal |
Todas as forças infernais desencadeadas abateram-se sobre a Cristandade ocidental. O desastre foi imenso.
Uma civilização que mal começa a se construir, nascida de um milagre – a conversão dos arianos e dos francos fora simplesmente milagrosa – e no momento em que inicia sua consolidação, sopram ventos tais que a tudo desconjuntam.
O fato é histórico, e Funck-Brentano a ele se reporta, sem contudo poder ver, naturalista que é, o que se passou além da ordem da natureza.
É um dos mais belos episódios da história da Igreja.
Uma civilização que não tivesse os seus recursos sobrenaturais teria sucumbido. Teríamos visto o seu desabamento e o fim da obra.
É fora de dúvida, contudo, que foi este desastre, em grande parte, a causa do nascimento do mais extraordinário regime político e social havido na história do mundo: o feudalismo.
continua no próximo post: A família na origem e na alma do Estado medieval - 2
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